LETÍCIA DE JESUS PEREIRA[1]
(orientadora)
RESUMO: O presente artigo aborda os impactos e as consequências que os crimes contra a administração pública geram na sociedade. Nesse sentido, a proposta é relatar os diversos crimes praticados por funcionários públicos contra a administração pública em geral, demonstrando o prejuízo econômico para a sociedade, bem assim analisar os efeitos da conduta do particular no crime de corrupção passiva, identificando os efeitos da omissão do particular, e, por fim, descrever alguns casos que geraram repercussões na mídia. Do ponto de vista metodológico, o trabalho realizou uma reflexão sobre o assunto, através de estudos bibliográficos e documentais, fundamentados em livros, artigos científicos e legislação sobre o tema. Por fim, pondera-se que os crimes que lesam a administração publica praticados por agentes publicos tem-se como causa a conduta ilícita do funcionário público e a aceitação da vantangem ilicita do particular, acarretando grandes problemas para a sociedade, entre eles, problemas sociais e econômicos. Conclui-se que as condutas são gravosas tanto para a Administração Pública quanto para a coletividade em geral, uma vez que recursos públicos desviados acabam por comprometer a prestação de serviços públicos, tais como saúde, educação, trabalho, entre outros.
Palavras-chaves: Administração Pública. Crime. Estado. Prejuízo à Coletividade.
ABSTRACT: This article addresses the impacts and consequences that crimes against public administration generate in society. In this sense, the proposal is to report the various crimes committed by public officials against the public administration in general, demonstrating the economic damage to society, as well as analyzing the effects of the conduct of the individual in the crime of passive corruption, identifying the effects of the omission of the particular, and, finally, to describe some cases that generated repercussions in the media. From a methodological point of view, the work carried out a reflection on the subject, through bibliographic and documentary studies, based on books, scientific articles and legislation on the subject. Finally, it is considered that the crimes that harm the public administration practiced by public agents are caused by the illicit conduct of the public official and the acceptance of the illicit advantage of the individual, causing great problems for society, among them, social problems. and economic. It is concluded that the conducts are serious both for the Public Administration and for the community in general, since diverted public resources end up compromising the provision of public services, such as health, education, work, among others.
Keywords: Public Administration. Crime. State. Harm to the Collective.
1.INTRODUÇÃO
Os crimes contra a Administração Pública ainda é um tema que causa discussão, já que provoca, geralmente, repercussão e graves consequências para toda a coletividade. Ainda existem grandes casos na sociedade atual, mas tais casos não são recentes, vez que podem ser observados desde o período colonial, iniciando-se desde os séculos passados no território brasileiro, através de comportamentos ilícitos por parte do funcionário público e do particular.
O desvio de finalidade por parte de funcionário público é uma das causas de crimes contra o erário, já que o desvio dos serviços públicos prestados por representantes da Administração Pública ocorre para obtenção de benéficos particulares. Assim, acarreta-se na degradação de valores morais e consequentemente sociais, pois esses atos prejudicam o desenvolvimento do país retirando o acesso a boa qualidade de vida da população, tornando-as vulneráveis.
Nesse contexto, esse estudo baseia-se no seguinte problema: quais os impactos que os crimes contra a administração pública geram para a sociedade? Esse estudo teve como objetivo geral analisar os crimes contra a Administração Pública e os consequentes impactos que causam à sociedade.
Assim, como objetivos específicos tem-se: a) explicitar os crimes praticados por funcionários públicos contra a administração, em conformidade com a previsão do Código Penal de 1940; b) analisar os efeitos da conduta do particular no crime de corrupção passiva; c) descrever alguns casos que tiveram repercussões, praticados contra a Administração Pública e as possíveis consequências para a sociedade.
Por fim, como procedimento, utilizou-se o método de pesquisa bibliográfico e documental, baseado em pesquisas de artigos científicos, doutrinas, sites de revistas e legislação sobre o tema. A abordagem é qualitativa, posto que impossível chegar a análises meramente quantitativas quanto à análise do objeto aqui em estudo.
2.CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PRATICADO POR FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS CONTRA A ADMINISTRAÇÃO EM GERAL
A Administração Pública é considerada um conjunto de órgãos governamentais que deve atuar de maneira conjunta, desempenhando um papel importante na eficácia para assegurar o bom funcionamento das funções do Estado, dividindo-se em função administrativa e política. Para efeitos penais, considera-se funcionário público não apenas o servidor legalmente investido em cargo público, mas também o que exerce emprego público ou, de qualquer modo, uma função pública, ainda que de forma transitória (SUMARIVA, 2012)
Nesse contexto, a Administração deve cumprir sua finalidade através do bom funcionamento de seus órgãos através de agentes públicos de maneira lícita. Masson (2014, p. 574) destaca o sentido da Administração Pública e a finalidade perante o Estado:
A expressão “administração pública” possui mais de um sentido, seja em razão da extensa relação de tarefas e atividades que compõem a finalidade do estado, seja em decorrência do elevado número de órgãos e agentes públicos incumbidos da sua execução.
Assim, o funcionário público deve respeitar a Administração Pública, baseando-se em conceitos indispensáveis, uma vez que os crimes contra ela protegem a moralidade e probidade, em conformidade com o que dispõe Greco (2012).
Os crimes de maior incidência, praticados contra a Administração Pública, são corrupção ativa e passiva, concussão, prevaricação, peculato e os demais de menor potencial ofensivo.
Através do conceito do Código Penal Brasileiro, o peculato tem como sujeito ativo o funcionário público que se apodera de coisas públicas em benefício próprio; o objeto material deve pertencer exclusivamente ao Estado ou durante a supervisão de um particular. A exemplo, seria quando um funcionário pertencente a Administração utiliza um ônibus destinado para uma determinada função pública, porém, é utilizado para realizar uma viagem em benefício próprio.
Na Roma antiga, esse crime era popularmente chamado de “Depeculatatus”, conceito destinado a prática do indivíduo que retirava objetos que pertenciam ao Estado. O crime de peculato está detalhado no Artigo 312 do Código Penal Brasileiro:
Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:
Pena: reclusão, de dois a doze anos, e multa
Seguindo os ensinamentos de Prado (2010, p. 432), trata-se de um crime com origem muito remota, cuja definição pode ser tida como “a subtração de bens pertencentes ao monarca ou governo, sendo punido o autor com a morte”, de acordo com as regras previstas no Código de Hammurabi.
A doutrina costuma dividir o peculato em: peculato-apropriação e peculato-desvio. No primeiro pune-se a conduta do agente que se apropria ou se apodera de bem público ou privado em decorrência do seu cargo. Assim, a conduta pode ser classificada em comissiva ou omissiva, consumando-se apenas com a posse do funcionário público sobre o bem. No peculato-desvio pune-se a conduta do funcionário publico que desvia o bem público para obter benefícios para si ou para terceiros. O crime está previsto na segunda parte do art. 312, caput.
Por conseguinte, acrescenta-se ao crime de peculato, o peculato-furto, onde se pune a conduta do funcionário público que retira um bem ou valor da administração pública, o crime de peculato-furto está previsto também no art. 312, §1º do Código Penal.
O peculato pode ser praticado tanto de forma doloso quanto culposa. Nesta última, o funcionário público deixa de exercer o zelo necessário de sua função e corrobora para que terceiro se aproprie ou desvie um valor ou bem público. Nesse sentido, é tipificada no §2º, art. 312 do código penal: “Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano” (BRASIL, 1940).
Além disso, outra espécie é o peculato é aquele praticado mediante erro de outrem/estelionato. Pune-se o funcionário público quando esse se apropria de um bem que é público por consequência de um erro. Masson (2014, p. 618) ensina:
Nada mais é, na verdade, do que uma modalidade especial de apropriação de coisa havida por erro, diferenciada pelo sujeito ativo, ou seja, um funcionário público prevalecendo-se das facilidades proporcionadas pelo exercício da função pública.
O peculato mediante erro está previsto no artigo 313 do Código Penal Brasileiro, nos seguintes termos: “Art. 313- Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa”.
Nesse sentido, o crime de peculato, dentre todas as suas espécies, percebe-se que está ligado à tutela dos bens estatais. Ora, quando o funcionário público prejudica os bens que pertencem ao estado, é ofendida a moralidade, o patrimônio público e em consequência a probidade administrativa.
Também como um dos crimes de maior incidência contra a Administração Pública cite-se a concussão, nome esse que deriva do Latim “Concutere”, onde pune o funcionário público que em razão do seu cargo ou fora de sua função, age de maneira coercitiva, praticando os verbos: impor, ordenar ou exigir uma ação para obter vantagem ilícita para si ou para terceiros de maneira direta ou indireta. A exemplo, cite-se um fiscal que exige dinheiro para não aplicar uma multa.
Esse crime está previsto no art. 316, caput do Código Penal, da seguinte forma: “Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida: Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa”.
Nesse sentido, para Masson (2014, p. 640), a concussão, muito embora não seja de conhecimento de todos, “é um dos mais praticados no território brasileiro”. Assim, esse delito é gravoso, pois o indivíduo pratica o abuso da função que exerce ao exigir, gerando uma imposição por parte do funcionário.
No delito de excesso de exação pune-se o ato do funcionário público que pratica o verbo: exigir, de maneira vexatória para a obtenção de um imposto ou contribuição pública de pessoa comum, de forma ilícita. Causando-lhe humilhação. O crime está previsto no art. 316, §1º de Código Penal:
1º - Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza:
Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa.
Destarte, o crime de exação é negativo, pois quando o funcionário exige um tributo, este retira os benefícios do contribuinte, prejudicando-o. Além disso, a forma ao conduzir o ato de maneira vexatória, acaba realizando um sentimento de medo no indivíduo.
Acerca do delito de corrupção ativa, o Código Penal pune a prática de particular sobre o funcionário público, ao praticar verbo “oferecer” ou “prometer” vantagem indevida para um funcionário público e obter benefício próprio. Exemplo dessa conduta seria um particular que oferece vantagem indevida a um policial com intenção a que este não aplica nenhuma multa.
Para Bitencourt (2011, p. 11) “[...] nas modalidades ''receber'' e ''aceitar'' a iniciativa parte do próprio particular, aceitando o funcionário público a sua oferta ou promessa, caracterizando-se, assim, a bilateralidade e crime de concurso necessário”.
O Código Penal dispõe sobre o crime de corrupção ativa:
Art. 333. Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
Parágrafo único – A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou a pratica infringindo dever funcional.
Nesse sentido, o crime de corrupção ativa é negativo, pois esse ato de aceitar é notório que esse individuo é facilmente corrompível, e consequentemente já não se importa em prejudicar a coletividade com atos ilícitos.
Acerca do delito de corrupção passiva, o Código Penal pune o funcionário público corrompido que pratica o verbo solicitar ou receber, para obtenção de benefício próprio ou para outra pessoa através da função que desempenha no Estado. Exemplo disso seria um policial servidor público que solicita vantagem indevida para alguém à custa de um benefício indevido.
Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem.
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)
Essa conduta é negativa, pois quando o funcionário público solicita vantagem indevida, inicia uma conduta para se beneficiar através a função que ocupa. Ora, gera-se uma desconfiança generalizada aos demais funcionários que não aderem essa prática, ora fere-se a proteção da moralidade.
Acerca do delito de contrabando, o Código Penal pune o funcionário público ao praticar o verbo facilitar, através da circulação de objetos ilícitos com a finalidade de exportar e importar, conforme art. 318: “Facilitar, com infração de dever funcional, a prática de contrabando ou descaminho (art. 334): Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa”.
Os delitos de contrabando e descaminho geram impactos à sociedade de formas distintas. O Descaminho, ao não passar pela correta importação e admitir o comércio de mercadorias que não tenham a devida tributação, gera impactos à economia nacional, enquanto no caso do Contrabando a situação é mais delicada, pois fomenta mercados ilegais, em tempo, SANTOS (2015, p. 1).
Contudo, o crime de contrabando pune o funcionário ao facilitar a circulação de objetos ilícitos, ato esse que é proporcionado por funcionários públicos que atuam com finalidade de exportar e importar.
Nesse sentido, a prática desse delito gera consequências, uma vez que acarreta em um prejuízo para a economia, pois gera a concorrência desleal em relação as indústrias que pagam tributo. Ora, ocorre a desestabilização no processo de fiscalizar, pois os funcionários contribuem para a desigualdade mercadológica.
Contudo, há um prejuízo no aspecto social, pois o monitoramento de fiscalização que ocorre de maneira desleal, prejudica o interesse dos estados e da sociedade. Ademais mercadorias que não passam por um sistema de segurança através de um órgão de fiscalização adequado por parte do Estado, influência para a pratica do crime organizado. Portanto, prejudica a sociedade e a administração pública.
3.CORRUPÇÃO PASSIVA: O INTERESSE DO FUNCIONÁRIO PÚBLICO
Acerca do delito de corrupção passiva, como já mencionado, pune-se o funcionário de conduta reprovável, pois esse solicita uma vantagem indevida. Assim, o sujeito passivo é o Estado e o sujeito ativo é o funcionário público. Classificando-se em crime formal e material, há divergências, a seguir:
Parte da doutrina considera o crime de corrupção passiva como crime formal, sem, no entanto, fazer nenhum tipo de ressalva à modalidade receber (CAPEZ, 2012, p. 582; JESUS, 2012, p. 208; MASSON, 2017, p. 721). Em contrapartida, há doutrinadores que consideram o receber como crime material (BITENCOURT, 2012, p. 302; CUNHA, 2017, p. 803; GRECO, 2017, p. 806/807) (Recurso Especial n.º1389718/RS e 1085432/MG ) (BRASIL, 2018, 2019).
Além disso, esse crime se consuma com a aceitação de uma vantagem indevida, tornando-se qualificada quando o funcionário retarda ou deixa de praticar um ato de ofício, omitindo-se de sua função, aumentando um terço da pena. Já nas modalidades ''receber'' e ''aceitar'' a iniciativa parte do próprio particular, aceitando o funcionário público a sua oferta ou promessa, caracterizando-se, assim, a bilateralidade e crime de concurso necessário (BITENCOURT, 2011, p. 111.).
Exemplo desse crime é um magistrado que solicita vantagem indevida para deixar de condenar um criminoso, beneficiando-se do exercício de sua função. Ademais, o Funcionário público abusa da sua competência através do desvio de função. Ora, A corrupção passiva se materializa quando o funcionário público, sujeito ativo do crime (PRADO, 2011, p. 486), em consequência ao cargo que exerce, ou até mesmo em ambiente distinto da função na qual exerce.
Nesse sentido, a corrupção passiva é definida como um crime próprio pois é exigido a prática por parte do funcionário. Frisa-se que, por ser crime próprio, somente quem possui a qualidade de funcionário público pode ser o sujeito ativo da corrupção passiva (JESUS, 2013, p. 206).
Conquanto, cabe citar as seguintes lições:
Para a aptidão de imputação de corrupção passiva, não é necessária a descrição de um específico ato de ofício, bastando uma vinculação causal entre as vantagens indevidas e as atribuições do funcionário público, passando este a atuar não mais em prol do interesse público, mas em favor de seus interesses pessoais” (Inq 4.506, Relator p/ acórdão: Min. ROBERTO BARROSO) (BARROSO, 1ª turma, 2018)
No entanto, é perceptível que a omissão advém não somente dos sujeitos que devem proteger a Administração Pública, entretanto, vem por parte do próprio individuo, que se torna cúmplice ao receber vantagem indevida, considerando como algo normalizado. Neste sentido:
A legitimidade da hierarquia das desigualdades constituiu uma relação dos cidadãos com o ilícito de forma muito permissiva. Essa permissividade perpassa toda a sociedade e descompromete, desresponsabiliza o cidadão com o público (PINTO, 2011, p.49)
Entende-se que a permissibilidade do particular ao se beneficiar de objetos pertencentes do Estado, acabam afetando os interesses pessoais dos funcionários públicos ultrapassando os interesses da coletividade. Ora, existe o quesito do senso comum enraizado, uma vez que:
A sociedade civil, tida como honesta por uma opinião pública construída pelo senso comum, ao mesmo tempo em que demoniza a corrupção política, aceita, com bastante tranquilidade, os pequenos ilícitos produzidos em seu próprio meio, como por exemplo, a sonegação de imposto de renda, muito comum no país (PINTO, 2011, p. 54)
Destarte, é necessária a destruição do senso comum, devido a aceitação de pequenos atos ilícitos que ocorrem por parte do particular. Nesse sentido, a partir de uma pesquisa realizada pelo instituto denominado de Vox populi por parte da universidade federal na cidade de Minas Gerais, foi possível constatar como as pessoas consideram desaprovável a conduta do parlamento quando o assunto envolve corrupção, porém consideram aprováveis as corrupções por parte do particular.
Em conformidade com as lições de Neto (2012, p. 82):
Isso explica por que pagar uma ''cervejinha'' para o guarda de trânsito não é considerado como algo tão ruim assim, em comparação, por exemplo, com o suborno de um empresário para vencer uma licitação pública. Mais de 30% dos entrevistados acham que dar dinheiro para um guarda para escapar da multa não chega a ser um ato corrupto. Quase 30% das pessoas ouvidas admitem fazer uma coisa um pouco corrupta para proteger alguém da sua família. Os prejuízos dos atos ímprobos são considerados mais graves ao interesse público quando se originam na administração pública ou no meio empresarial. Outra comprovação marcante da pesquisa é a falta de noção de responsabilidade coletiva dos indivíduos, decorrente, ao que parece, da fragilidade do conceito de interesse público. Segundo consta, 74% dos entrevistados do Estado da Paraíba acham que interesse público é algo de responsabilidade do Estado, passando o índice para 17% no Estado de São Paulo. Tal noção patrimonial do que seja interesse público, como sustentamos, torna inviável o combate à corrupção. O público acaba por se confundir com o privado.
Nesse sentido, é perceptível a falta de informação sobre a diferença entre o interesse público e privado. Ora existe uma fragilidade pois a população desconhece o conceito de que é pertencente ao interesse público, tornando-se vulnerável. Observa-se que o recebimento de vantagem ilícita ocorre em todos os setores, dentre o público e o privado. Entretanto, a modalidade pública é mais reconhecida, porem ocorre no dia-a-dia em especial na modalidade privada em grande proporção.
De acordo com Pinto (2011, p.52):
Em verdade, a corrupção privada, modalidade praticada não só pelas grandes empresas, mas também por pessoas comuns, supera em larga escala os números de ocorrência da chamada corrupção intra-Estado, esta última entendida como aquela que se realiza no interior do parlamento.
Percebe-se, a divulgação de casos que estão presentes figuras públicas, ou mais conhecidas. Porém, é nítido perceber que os casos que envolvem o particular são menos divulgados, entretanto, estes acontecem no dia-a-dia e em grande proporção em sua grande maioria.
É perceptível a conduta do particular ao receber vantagem ilícita advém do aspecto cultural adotado para garantir interesses próprios. Nesse contexto, Reis (2012, p.329) aponta:
No caso do Brasil, é bem clara a vigência de uma cultura que vê com olhos lenientes a trapaça em favor do interesse próprio e a 24 inobservância das regras em qualquer plano, e que provavelmente se articula com nossa herança de escravismo, elitismo e desigualdade. Mas essa cultura surge também nos dados precisos de pesquisas sistemáticas executadas em plano mundial, com numerosos países de níveis distintos de desenvolvimento econômico e de religiões e tradições culturais diversas, em que o Brasil surge reiteradamente como o grande campeão da desconfiança nas relações interpessoais: não vai além da faixa de míseros 3% a proporção dos brasileiros que responde positivamente à pergunta sobre se pode, em geral, confiar na pessoas (a proporção correspondente para os países escandinavos, por exemplo, alcança 65% ou mais)
Portanto, percebe-se que além do aspecto cultural que prevalece entre as relações sociais, permanece o aspecto da desconfiança generalizada nos indivíduos. Ora, em consequência disso, o Estado democrático acaba não evoluindo, pois um estado no qual o povo não confia em seus representantes, gera a desconfiança e com consequência a aceitação de atos ilícitos.
Nesse sentido, Pinto (2011, p.54):
É preciso, entretanto, chamar atenção para o fato de que a grande e entranhada corrupção é a que comunica a sociedade civil com o Estado, através de um sem-número de maneiras, mas sempre corrompendo os dois lados e criando privilégios e vantagens pecuniárias para ambos. Há um arco enorme desse tipo de corrupção, que, como já exemplificado anteriormente, vai desde a propina a um guarda de trânsito para não ter uma multa lavrada até fraudes em licitações ou em serviços públicos que envolvem bilhões de reais. Envolve tanto o cidadão comum, que se indigna com os escândalos do Senado, como grandes quadrilhas que pertencem a 25 setores importantes da economia. Por que essas atividades, tão ou mais perniciosas ao país, são muito menos discutidas e publicizadas pela mídia?
Nesse sentido, é notória a percepção distorcida de que os atos ilícitos contra a Administração Pública é um problema apenas de classe elitizada, mas não é, pois se desenvolve em todos os ambientes. Ora, para ocorrer uma conduta ilícita, exige-se da participação e colaboração do particular. Nesse sentido, as consequências da conduta do particular na aceitação de vantagem ilícita no crime de corrupção passiva são gigantescas.
A omissão por parte do particular acaba tendo como consequência de maneira significante o aumento de casos de corrupção e, consequentemente, a perda de valores éticos e morais, perda da confiabilidade da ineficácia da lei. Portanto, é essencial incentivar a população no quesito da realização de debates que influenciam na conscientização da conduta do particular, sobre as condutas ilícitas que são normalizadas.
4.CASOS DE CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA COM GRANDE REPERCURSSÃO NO BRASIL E AS POSSÍVEIS CONSEQUÊNCIAS PARA A SOCIEDADE
É evidente que os crimes contra a Administração Pública vêm se prolongando no decorrer dos anos na sociedade brasileira, causando lesão ao erário. Portanto, convém elencar neste artigo os casos mais populares de crimes contra a Administração. Primeiramente destaca-se o caso de grande repercussão, o caso do mensalão, em 2005, e posteriormente o caso da lava jato.
O caso do mensalão iniciou-se após uma denúncia do deputado federal Roberto Jefferson (PTB – RJ), ao jornal folha de São Paulo, no ano de 2005. Esse foi acusado de estar envolvido em processos fraudulentos praticadas por funcionários da empresa brasileira de correios telégrafos interligados ao PTB, Partido trabalhista brasileiro, confirmando-se que alguns deputados aceitavam uma espécie de mesada de 30 mil reais para votar por interesses próprios e do governo. Assim, vários partidos faziam parte do esquema, dentre eles, o Pl (Partido Liberal), PP(Partido progressistas), PMDB (Partido do movimento democrático),PTB( Partido trabalhista brasileiro),. (GALLI, 2007).
Após o episódio, o ministro da Casa Civil, chamado José Dirceu, foi considerado como o mandante do esquema, responsabilizando o Sr. Delúbio Soares, após o pagamento em dinheiro para os demais deputados. Dessa forma, no ano de 2007 no mês de agosto, após o STF ter acolhido o recurso do MP, foi aberto um processo para responsabilizar as pessoas envolvidas, como José Dirceu, Luiz Gushiken, Anderson Adauto, João Paulo Cunha, Marcos Valério, Roberto Jefferson. DUARTE (2015, p.1). Esses indivíduos responderam por corrupção passiva, corrupção ativa, lavagem de dinheiro, entre outros. Esse acontecimento deu-se no primeiro mandato do ex presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, porém. as informações necessárias para a sua condenação foram insuficientes.
Outro caso de grande repercussão midiática foi o da Operação Lava Jato, assim nomeada por ser a maior lavagem de dinheiro que aconteceu no contexto histórico da sociedade brasileira. Considera-se o momento primordial envolvendo o ex-deputado federal José Janene (Londrina-PR), Alberto Youssef e Carlos Habib Chater (OLIMPIA, p2,2022,)
Os principais crimes praticados foram de corrupção passiva, corrupção ativa e lavagem de dinheiro, pois a estatal Petrobrás tornou-se vítima de práticas corruptas em processo licitatório. Assim, ocorreu o ato de facilitar negociações por meio de propinas no momento do recebimento de propostas de construção de empreiteiras da Petrobrás. Portanto, essas ações tornaram-se concretas após o envolvimento de agentes públicos da própria estatal e agentes políticos, sempre reunindo-se em prol do interesse privado descartando o interesse público.
Nesse contexto, a participação de agentes que trabalhavam em prol da estatal destacou o maior percentual em indivíduos que tinham prerrogativas de função, dificultando a identificação de práticas ilícitas.
Nesse sentido, o caso da Lava Jato trouxe grandes prejuízos através da presença do crime de corrução passiva e lavagem de dinheiro. Assim, foi perceptível que a mídia repercutiu e divulgou de forma ampla esse caso, considerado grave em consequência a quantidade de dinheiro desviado. Porém, é importante mencionar que os casos menos divulgados pela mídia na qual exige a participação do particular é de grande importância, pois essas ações corroboram para o prejuízo nos cofres públicos.
A sociedade, de um modo em geral, sofre com as consequências em razão da prática de delitos aqui relatados e uma das principais consequências é o prejuízo econômico para a Administração Pública, a propagação e divulgação distinta da figura do servidor público comprometendo toda a classe de funcionários.
Nesse sentido, a utilização do cargo público em favor de benefício próprio, gerou uma desconfiança por parte da população. Segundo Concli (2017, p.1) esta desconfiança é um atraso à democratização prevista pela Constituição Federal de 1988. Ora, o povo que não confia e respeita o funcionário que representa o Estado, acaba corrompendo-se.
Portanto, outra consequência para a sociedade se faz no âmbito da política. Ademais, o cenário de corrupção nesse ambiente cresceu, em razão de pessoas que utilizam do cargo público para se beneficiar.
Nesse sentindo, deve-se enfatizar a consequência da corrupção e o prejuízo para a população, esse prejuízo ocorre em vários âmbitos e esferas: federal, estaduais, distrital e municipais. A exemplo de municipal é quando a figura do prefeito desvia verbas públicas que deveriam ser revestidas em serviço público. Contemplando o texto acima:
O autor traz o exposto por Trevisan et al. (2006), de que a corrupção é um mal do poder público em todos os níveis, principalmente o municipal, que sofre com os desvios de recursos públicos, que acarretam no abandono de obras importantes para a vida urbana, e um estado crônico de subdesenvolvimento (OLIVEIRA, 2008, p.59)
Além disso, a corrupção modifica o destino dos recursos públicos, prejudicando as necessidades básicas de cada indivíduo. Uma vez que, para Abramo (2004, p.4),
A corrupção mina a capacidade de investimento estatal, os recursos públicos são direcionados para uma pequena parcela da população, e pouco sobra para investimentos voltados as necessidades da maioria, somado com o agravo do mal gerenciamento do poder público, que pouco faz.
Nesse sentido, todos os crimes contra a Administração são devastadores, em especial a corrupção que corrobora para o prejuízo social e econômico. A maneira mais hábil no combate dos crimes mencionados nesta pesquisa refere-se a mudança na mentalidade de maneira individual e coletiva, para assim reinterpretar os conceitos que foram enraizados desde o antigo regime para só então ocorrer a mudança moral e cultural que o país necessita.
6.CONCLUSÃO
A partir desta pesquisa foi possível analisar o impacto que os crimes contra a Administração Pública acarretam na sociedade, o que se deu por meio da verificação de ações que geram consequências para a sociedade. Nesse sentido, as principais consequências são prejuízos sociais e econômicos.
Através da análise de vários autores renomados, pôde-se relatar os variados crimes que ocorrem por funcionários públicos que tem como sujeito passivo a Administração Pública. Ademais, foi possível a análise dos efeitos da conduta do particular no crime de corrupção passiva, pois essas são consideradas menos gravosa por parte da população, mas ainda assim trazem prejuízo para o patrimônio público, sendo consequências da omissão por parte do particular.
Além disso, foi possível demonstrar através de casos que tiveram grandes repercussões por parte da mídia as consequências para a sociedade brasileira, tais como o Mensalão e a operação Lava Jato.
Por fim, estas condutas vêm se repetindo desde o século XXVL, perpetuando-se no século XXl, sendo necessário primeiramente ocorrer mudanças na população em comum, no próprio indivíduo, como sociedade. Ora, para modificar um país enraizado na prática de corrupção, é necessária a construção de uma educação individual baseada em princípios éticos e morais.
REFERENCIAS
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[1] Advogada. Assessora Jurídica (PGE/MA). Mestra pelo Programa de Pós Graduação em Formação Docente em Práticas Educativas (UFMA). Mestra pelo Programa de Pós Graduação em Direito (UNIMAR). Especialista em Direito Penal e Processo Penal (Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus). Professora do Instituto de Ensino Superior do Sul do Maranhão (IESMA/UNISULMA).
E-mail: [email protected].
Graduanda do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão – IESMA/Unisulma
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JESSEMINE INDALÉRCIA GOMES DE ARAÚJO, . Crimes contra a Administração Pública e os danos para a sociedade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 out 2022, 04:19. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos /59653/crimes-contra-a-administrao-pblica-e-os-danos-para-a-sociedade. Acesso em: 27 dez 2024.
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